A nova era dos juros altos: o que o mundo aprendeu (ou não) desde 2020

Após uma década de dinheiro barato, o mundo encara o custo de capital mais alto em uma geração — e um novo equilíbrio entre risco, dívida e crescimento.

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Durante mais de uma década, o dinheiro parecia não ter preço. Governos, empresas e investidores operaram sob a lógica de que o custo de capital seria eternamente baixo — um subproduto da crise de 2008 e das políticas monetárias ultraexpansionistas que se seguiram. Os juros zero tornaram-se a norma, e a liquidez abundante, uma espécie de anestesia global. Mas o choque inflacionário pós-pandemia e as mudanças geopolíticas trouxeram um despertar abrupto. O mundo entrou na nova era dos juros altos, e a adaptação está apenas começando.

virada monetária iniciada pelo Federal Reserve em 2022 marcou um ponto de inflexão histórico. Pela primeira vez em 40 anos, a inflação nos Estados Unidos superou os 9%, exigindo uma reação rápida e coordenada dos bancos centrais. O Banco Central Europeu, o Banco da Inglaterra e até o Banco do Japão, em graus distintos, abandonaram a complacência com juros negativos. O foco agora é a estabilidade de preços a qualquer custo, mesmo que isso signifique enfraquecer o crescimento e reprecificar ativos em escala global.

Esse movimento representa mais que um ciclo conjuntural — é uma mudança estrutural. Durante a “era do dinheiro barato”, dívidas soberanas cresceram silenciosamente, empresas se alavancaram a custo irrisório e valuations de tecnologia se expandiram sem lastro em fluxo de caixa. Agora, com o custo do capital próximo de 5% nos EUA e acima de 4% na zona do euro, o mundo redescobre um princípio básico: o tempo e o risco voltaram a ter preço.

As consequências são profundas. Em economias emergentes, o efeito colateral mais imediato foi a fuga de capitais e a pressão sobre moedas locais. O real, o peso argentino e a lira turca voltaram a refletir o desequilíbrio entre risco e retorno. Para países altamente endividados, como Itália e Japão, a conta dos juros altos também chega na forma de orçamentos comprimidos e dívida pública crescente. A era da expansão fiscal ilimitada parece ter encontrado seu limite.

No mercado financeiro global, assiste-se a uma reprecificação generalizada dos ativos. Títulos de renda fixa voltaram a oferecer rendimento real, enquanto setores intensivos em capital, como imóveis e tecnologia, passaram a enfrentar ventos contrários. A relação entre risco e retorno foi redefinida — e o investidor global precisa reaprender a calcular o valor do tempo.

Para o investidor brasileiro, compreender esse cenário é essencial. O custo do capital global influencia diretamente o valor do dólar, os fluxos para emergentes e a atratividade dos ativos internacionais. Em um mundo onde o dinheiro “volta a custar caro”, diversificar passa a ser menos sobre buscar ganhos e mais sobre preservar poder de compra e estabilidade de portfólio.

Há quem aposte em um retorno aos juros baixos, impulsionado por avanços tecnológicos e pela desaceleração econômica. No entanto, o consenso entre analistas e autoridades monetárias — de Jerome Powell a Christine Lagarde — é de que o período de “higher for longer” veio para ficar. Isso não significa um aperto eterno, mas sim um mundo em que a taxa neutra de juros é estruturalmente mais alta, refletindo um ambiente de menor liquidez, maior risco geopolítico e restrições fiscais mais rígidas.

A história mostra que períodos de normalização monetária costumam redefinir não apenas portfólios, mas também comportamentos. A geração que se formou sob o paradigma dos juros zero agora precisa reaprender a lidar com escassez. É um retorno ao realismo econômico: o crescimento tem custo, a dívida tem consequência e o dinheiro, novamente, tem valor.

Em uma carta de 1987, o então presidente do Fed, Paul Volcker, escreveu que “a credibilidade da política monetária é o ativo mais valioso de uma nação”. Quase quatro décadas depois, o mundo redescobre essa lição. O preço do dinheiro não é apenas uma variável técnica — é o reflexo da confiança nas instituições e do equilíbrio entre presente e futuro.


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